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As Brumas de avalon

  • Foto do escritor: Italo Aleixo
    Italo Aleixo
  • 11 de ago. de 2023
  • 3 min de leitura



Esqueça a ação e o ritmo alucinante, nem espere por grandes batalhas ou feitos heróicos, nessa que provavelmente é a mais popular adaptação das lendas Arturianas, Marion Zimmer Bradley narra a vida de Arthur e os Cavaleiros da Távola Redonda, em uma abordagem singular: As Brumas de Avalon não é uma mera história de aventura, mas sim um épico sobre desejo, ambição, luxúria e sonhos despedaçados, um livro memorável sobre o choque da cultura celta com o cristianismo e acima de tudo, uma obra sobre o universo feminino!


É uma obra prima sobre a perda e a inexorabilidade do destino, a medida que Avalon se perde nas brumas, vemos o desaparecimento da cultura celta sucumbindo ao avanço dos intolerantes cristãos, restando apenas uma tentativa dos últimos adeptos para manter vivos os ritos e a memória dos deuses antigos. Fé, a força motriz da trama está presente na convicção da existência da magia, nos cultos à carne dos pagãos ou na crença e temor do incompreensível pelos cristãos, dessa forma religião e sexo são usados como ferramentas para manipular reinos e urdir as teias do destino. Não importa se cristãos, pagãos, ou ateus, todos utilizam suas crenças e convicções para moldar o mundo na imagem que melhor lhes apetece.


As Brumas de Avalon é acima de tudo um livro sobre as mulheres, enquanto os homens ficam a deriva no mundo vivendo suas aventuras, são as mulheres que narram e conduzem toda a história. Igraine, Viviane, Guinevere, Morgause e tantas outras, são as verdadeiras protagonistas da obra e pairando acima de todas elas a personagem principal, maior vítima, heroína e vilã da obra: Morgana. Uma poderosa obra literária sobre o mundo feminino, onde mesmo submissas à vontade dos homens, são elas quem, direta ou indiretamente, observam, comandam e tramam todos os acontecimentos. Marion Zimmer Bradley não faz da abordagem ao Feminino um mero discurso panfletário, aqui relações humanas são críveis. Mesmo com papéis a cumprir e obrigações triviais, como cuidar da casa ou gerar filhos, as mulheres com seus desejos e todo poder que seus corpos lhes confere, são de longe as personagens mais interessantes do épico.


Mesmo com esse enfoque na personalidade dos personagens e no mundo feminino, sobra espaço para uma bela narrativa fantástica, para a contemplação do mundo e para os próprios Cavaleiros de Arthur. A ausência da ação traz uma estética singular para a obra, que se torna minimalista e introspectiva, os renomados cavaleiros de Arthur estão lá realizando suas proezas e erigindo suas famas, mas é a paisagem úmida e vasta da Bretanha, com suas charnecas, morros e florestas que chama a atenção, de tal forma que essa grandiosidade é um convite à reflexões filosóficas a cerca da natureza dos personagens e acerca da própria realidade. A magia está no ar, mas o mundo fantástico de Avalon vai aos poucos dando lugar à um mundo mais realista, onde encantos e milagres muitas vezes podem ser explicados como mera convicção ou fé. Ainda assim, divindades estão presentes por trás das brumas da realidade e contemplar esses seres muitas vezes leva à loucura ou epifania, uma noção do "sagrado" semelhante à utilizada por Lovecraft ou Arthur Machen, onde a manifestação de entidades faustosas demais pode destruir a mente daqueles que as vislumbraram.


Acima de tudo, As Brumas de Avalon é uma obra melancólica, trata da passagem do tempo e da inevitabilidade do destino, à medida que personagens vem e vão e seus sonhos vão sendo esmigalhados, fica evidente o peso que isso traz para a psique. Apesar de todos os personagens serem notáveis, o destaque inevitavelmente vai para Morgana, nossa principal narradora que acompanha todos os acontecimentos do princípio ao fim e que sempre se depara com verdades muito maiores do que aquelas que ela acreditava. A mais famosa adaptação das lendas Arturianas originais, representa a passagem do tempo também para aquele mundo mágico. Antes presente na vida das pessoas, vemos Avalon sendo varrida para as sombras, separada do mundo real e obrigada a viver para sempre escondida entre as Brumas. A cena final é por si só simbólica demais, é uma despedida não só desse mundo mágico, mas de uma era que ficou para trás. Não é sem méritos que As Brumas é um dos livros mais influentes da literatura mundial, é a clássica lenda de Arthur focada em seus aspectos filosóficos, repleta de monólogos e reflexões, onde saem de cena os heróis e entram em palco as pessoas: com medos e desejos, ora poderosas ora frágeis, mas sempre humanas!


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