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O Pensamento ecológico

  • Foto do escritor: Italo Aleixo
    Italo Aleixo
  • 21 de set. de 2024
  • 4 min de leitura
Capa do livro O Pensamento Ecológico de Timothy Morton

Se quisermos salvar o planeta precisamos não apenas de ações concretas, mas também mudar o nosso modo de pensar. Por isso a filosofia é uma ferramenta tão importante, pois é através dela que o conhecimento humano é analisado e novas narrativas são criadas no processo. Em O Pensamento Ecológico, o filosofo Timothy Morton apresenta sua proposta de uma nova narrativa que vai de encontro com a noção atual de ecologia e propõe, entre outras coisas, a rejeição da natureza como tal!


Para Morton o grande problema está na maneira como reificamos a natureza, ou seja, como transformamos ela numa entidade à parte dentro da realidade e nos submetemos à busca de algo inalcançável. Ao colocarmos a natureza num pedestal, nós automaticamente nos apartamos dela e passamos a perseguir um estado idealizado — que na realidade está sempre em transformação. É com isso em mente, que o filósofo propõe sua ontologia, onde a natureza não existe como um objeto distinto, mas como parte do todo.


Morton ancora a construção de sua narrativa erigindo certos conceitos, sendo o mais fundamental deles o da malha, onde TODAS as coisas do universo estão conectadas e mantêm inter-relações. Nenhuma entidade no universo atua isoladamente, nem mesmo uma mera partícula, tudo interfere em tudo, a malha descentraliza o que existe e coloca todas as coisas em perspectiva: a árvore da vida deixa de ser uma árvore — como menciona Rodrigo Petronio no posfácio da edição brasileira — e se iguala à todo o resto. Dessa forma tiramos a natureza idealizada do pedestal e nos inserimos diretamente como parte dela. Sem centro, também não existem bordas externas, a malha não tem início ou fim, dessa forma não só as espécies não podem ser diferenciadas umas das outras, mas os próprios seres vivos não se diferenciam entre dentro e fora — essas já são discussões bem antigas da biologia. A vida e a não vida passam a ser a mesma estrutura.


Dentro dessa malha são inseridos outros conceitos, também interessantes, como o estranho estrangeiro, a noção de que nunca poderemos acessar a completa realidade de um objeto, mesmo que seja ele comum ao nosso cotidiano; os hiperobjetos, que transcendem a nossa experiência de tal forma, que não podem ser situados numa localidade ou mesmo tempo específicos (como a radiação, o aquecimento global, o microplástico, etc.); e outros conceitos estéticos e morais como, empatia, egoísmo e altruísmo.


Mesmo soando interessante, essa ecologia profunda proposta por Timothy Morton não é totalmente inovadora, muitos desses conceitos já são conhecidos da ecologia tradicional, ela simplesmente varre para baixo do tapete os problemas que a ecologia tem enquanto ciência, como a incapacidade de fazer predições a partir de dados empíricos — uma vez que a correlação entre os elementos do sistema de fato são imprevisíveis — propondo essa "nova maneira de pensar". É aí que o livro de Morton se torna confuso.


Em momento algum fica muito clara qual é a proposta do autor de fato, como dito, os conceitos propostos em sua ontologia não são realmente inovadores, mas sim analisados por uma óptica filosófica diferente. O fato é que, O Pensamento Ecológico é, antes da proposta de uma nova ontologia propriamente dita ou da introdução aos seus conceitos — como promete —, uma espécie de brainstorm, com ideias soltas, citações literárias, referências musicais, críticas artísticas e religiosas, que se misturam sem nenhuma organização de fato. Fazendo jus a sua ideia de malha, é provável que a compreensão de sua obra se dê apenas após a leitura de livros que sequer foram lançados. De fato, a bibliografia do autor é vasta, então talvez esse livro não seja uma introdução adequada mas sim uma pequena peça de um sistema que é preciso ser acompanhado como um todo.


Propondo uma visão contrária à da epistemologia clássica, o pensamento de Timothy Morton é uma vertente da filosofia especulativa. Enquanto a primeira pensa na realidade sempre mediada pela experiência, essa última tenta abarcar a existência dos objetos independente de sua interação com a percepção. Essa sempre foi uma linha divisória que todo pensador sonha em conquistar. A epistemologia clássica aceita sua existência considerando tudo para além dela como metafísico — e consequentemente impossível de ser estudado — enquanto a filosofia especulativa volta a pensar no que existe para além dela, como fizeram muitas vezes outros filósofos no passado. A questão é como fazer isso sem recorrer à religião e mitologias?


Eu só me pergunto é como isso funciona na prática. O Pensamento Ecológico soa mais como um delírio abstrato de inúmeras citações artísticas do que como algo concreto, não é atoa que o autor se defenda a todo momento de soar niilista. O livro é confuso, o problema está mais na construção do pensamento do que com o pensamento de fato. Eu gosto das reflexões que Morton traz à tona, acho que elas são essenciais para o pensamento humano, assim como gosto da maneira que Nieztsche descontrói de maneira similar o conhecimento humano, mas nessa empreitada de propor uma nova ontologia para a emergência ambiental que estamos enfrentando, tudo soa muito abstrato.


Morton ataca pontos claros: a mentalidade do capitalismo que consegue se reinventar se apropriando de qualquer problema; os direitos dos outros seres vivos, num sistema onde ninguém é mais importante que ninguém; as implicações estéticas na impossibilidade da existência de uma natureza idealizada; a nossa relação com os hiperobjetos que devem perdurar por milênios; etc. Mas não o faz de forma clara e em meio as transgressões literárias do autor, é realmente difícil saber do que ele está falando.


Nós de fato estamos inseridos dentro de uma grande malha, mas como explicar a necessidade de proteger o meio ambiente se nós somos o meio ambiente!? Como funcionaria na prática tal tipo de narrativa. As reflexões são válidas mas a proposta é muito inconstante e quebradiça. Talvez o pensamento do autor ganhe corpo melhor com a leitura de suas outras obras, porque é difícil ver O Pensamento Ecológico como a porta de entrada para um novo tipo de ecologia de fato!

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