o ultimo duelo

Mais do que pelo mero prazer da leitura, eu amo nos livros o fato deles serem um registro histórico. É fascinante viajar pelo mundo — ou pelo tempo — tendo a literatura como veículo, visitar novas paisagens e conhecer outras culturas. Aqui, nos vamos até a França medieval, palco de um dos últimos e mais populares duelos mortais entre cavaleiros treinados, quando Marguerite acusou Jacques Le Gris de estupro e teve sua honra e sua própria vida julgadas num combate mortal entre seu marido, Jean de Carrouges, e o acusado.

Diferente do filme, esqueça os romances históricos nos moldes de Bernard Cornwell ou Steven Pressfield, O Último Duelo está mais para um documento acadêmico do que para uma obra literária. Eric Jager retrata, após uma vasta pesquisa à documentos medievais, esse que foi um dos julgamentos por duelo mais famosos da França. A narrativa é um texto histórico conciso dos eventos, que tenta retratar o ambiente e as ações reais dos personagens.

O livro tem como maior mérito a ambientação da Idade Média. Mesmo com descrições pragmáticas, Eric Jager consegue não só recriar o cenário histórico do Século XIV (castelos, povoados, estradas, etc...), como contextualiza muito bem sua narrativa, com "imagens" memoráveis de batalhas da Guerra dos Cem Anos, na Inglaterra, até conflitos no Oriente Médio pelas Cruzadas. Além da paisagem e das batalhas, os detalhes da cultura e do estilo de vida da época, são muito bem retratados pelo autor.

Adicionalmente ao contexto físico do livro, temos um vislumbre do contexto filosófico e da legislação medieval, que embora fosse regida por conceitos religiosos absurdos e noção científica bastante arcaica, já era bem fundamentada e até hoje reflete em alguns aspectos jurídicos modernos — discutidos por Eric Jager.

O grande trunfo do livro é que, justamente por não ser um romance, ele não distrai o leitor com aventuras ou sentimentalismo, mas apela para seu lado realista. Um retrato cru da idade média, época tão romantizada pela cultura pop, mas um período negro, onde a guerra era onipresente, execuções públicas rotineiras e as mulheres não tinham nem o direto de se defender contemplado em lei!