O Estrangeiro
- Italo Aleixo
- 21 de fev. de 2024
- 2 min de leitura

O século XX foi um momento de grande reflexão para o gênero humano, uma vez que as revoluções ocorridas no Ocidente trouxeram à discussão Narrativas individualistas como, o Existencialismo e o Humanismo — as vezes considerado a grande religião da modernidade — e o homem passou a olhar cada vez mais para dentro de si em busca de dar um sentido para a vida. Essas indagações repercutiram amplamente na literatura e na filosofia, enquanto Nietzsche defendia que tal libertação das amarras poderia levar ao surgimento do super-homem, Dostoievski mergulhava seus personagens na angústia causadas por essa ausência de sentido. Tais Narrativas podem ter nuances positivas e significar liberdade para o indivíduo ou podem inclinar para o pessimismo e culminarem no individualismo ou puro egoísmo. Esse "pessimismo literário", ganhou formas nas páginas de Céline, Phillip Roth e Bukowski.
Albert Camus, um grande intelectual do século XX, segue os passos de Dostoievski e também usa a literatura para divagar sobre as ideologias da época, em especial o Existencialismo. Em O Estrangeiro, Meursault é julgado por um crime, porém responde à todo o processo com uma despreocupação que beira a indiferença. Aqui fica evidente uma influência direta de Crime e Castigo, que também utiliza um assassinato para ponderar a filosofia de seu personagem, mas enquanto o protagonista da obra russa, Raskólnikov, é fervoroso em tentar provar seu ponto de vista, Meursault é dotado de uma apatia doentia e um desligamento total com as Narrativas vigentes.
O que me desagrada na obra de Camus, não é o debate filosófico em si, mas sim as escolhas narrativas feitas pelo autor — e uma vez que se trata de uma obra literária, antes de um ensaio filosófico, é pertinente ponderar esses fatores. Até certo ponto, Mersault mostra muito do pessimismo presente no excelente Viagem ao Fim da Noite, mas enquanto o protagonista da obra de Céline é um mau caráter em essência, que luta para sobreviver e ostenta esse rótulo sem remorsos, o personagem de Camus apresenta uma apatia completa que atrapalha o andar da leitura. Esse é o grande problema, apesar de ser considerado assim, é difícil ver Meursault como um símbolo de seu tempo: o típico cidadão comum, mas que não sofre, não discute ou nem mesmo assume uma postura completamente egoísta — como na obra de Céline — e por isso o personagem acaba se tornando um tanto quanto inverossímil. A postura do protagonista, faz com que o próprio enredo tome decisões pouco convincentes: dificilmente um personagem tão passivo e desprovido de vontade seria capaz de cometer um assassinato premeditado, mas mesmo assim o faz por uma conveniência narrativa.
É certo que O Estrangeiro figura na lista dentre os vários "romances do século", mas sendo esse o caso, figura apenas numa posição modesta!
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