Maniac
- Italo Aleixo
- 31 de dez. de 2024
- 2 min de leitura

Benjamin Labatut parece não lidar tão bem com a prosa mais longa como o faz com os contos curtos. No excelente Quando Deixamos de Entender o Mundo, livro que concedeu fama ao autor, os contos são fulminantes, certeiros. Usar a mesma temática e estender a narrativa não funciona muito bem aqui.
O tema principal da escrita de Labatut é o impacto que o conhecimento traz para aqueles que o desvendam: como a mente humana passa a encarar o mundo quando os alicerces, nos quais a realidade se apoia, são implodidos? O roteiro instigante que a primeira vista lembra Cosmos, logo inclina para uma filosofia caótica, mais nos moldes de Oppenheimer.
Maniac usa a mesma fórmula dos livros anteriores: contar a história de cientistas que pagaram com a própria sanidade o vislumbre desse limiar. O personagem da vez é John Von Neumann! Neumann é um personagem modelo da literatura labatutiana, o matemático foi figura notória do Século XX e entre suas realizações estão: a proposta da existência de sistemas autorreplicantes (que antecipava em mais de dez anos a descoberta do DNA), os cálculos matemáticos por de trás das bombas atômicas, a invenção dos computadores modernos, a Teoria dos Jogos, as sondas de Von Neumann, etc. Ao tentar explicar e desvendar a realidade, Neumann desumanizou o homem e reduziu o mundo em meros modelos matemáticos, atingindo os maiores avanços tecnológicos do século.
O personagem por si só sustentaria todo um livro de contos sobre sua pessoa, mas nessa proposta de romance as coisas não se encaixam muito bem. Na prática, cada capítulo — narrado por alguma personalidade que conviveu com Neumann — funciona como um conto a parte, mas a ausência de um desfecho para esses "contos" compromete a obra, que vai se estendendo a deriva e perdendo o fio condutor. Se num dado momento estamos vendo o "surgimento de formas de vida digitais", de uma hora para a outra, somos lançados abruptamente aos bastidores do Projeto Manhattan, sem muita conexão. Uma vez que nunca chega aquele esperado desfecho apocalíptico, os contos vão simplesmente se ligando um ao outro interminavelmente e as descobertas de Neumann vão se diluindo e perdem o impacto.
O livro ainda conta com uma segunda parte, bastante desconexa do tema principal, onde avançamos para o Século XXI e acompanhamos Lee Sedol, um lendário jogador de Go, que perde o interesse no jogo depois de ser derrotado por uma IA. A história ainda que interessante, é quase que apenas uma transcrição literal do documentário AlphaGo.
Maniac não chega a ser ruim, todos os elementos que deixaram Labatut famoso estão lá, mas a falta de foco tira o brilho do livro. É evidente que o grande tema que o autor quis discutir era a vida digital, o surgimento de uma consciência dentro dos microchips dos computadores, a história de Von Neumann converge com o advento das Inteligências Artificiais. Mas Maniac não consegue captar essa essência, já que a narrativa mais longa não se mostrou tão precisa quanto seus contos.
Comments